domingo, outubro 29, 2006

Aos meus alunos

As palavras têm momentos certos, oportunos e alturas adequadas. Repetidas muitas vezes, perdem o brilho, o viço e a força; omitidas quando devidas, deixam mergulhados no mar da ausência e envoltos pelo horizonte da solidão aqueles que delas dependiam. Oferecidas no momento certo podem mudar a vida e o destino das pessoas.
Talvez este seja o momento para me dirigir a vós como Vosso docente, colega, e acreditem, amigo.
Confio em Vós e na possibilidade de vencermos os desafios que um novo ano lectivo, em particular, o presente, nos coloca a todos.
Está cansada a oração da dificuldade, esgotada a pequenez colocada em bicos de pés pela conversa insidiosa e nu o corpo da crítica fácil e cínica.
Está também extenuado o discurso das boas intenções e baço o brilho das promessas adiadas, umas e outras desaparecidas e depois repristinadas a cada novo ano.
Aceitar o desafio não é tarefa fácil: obriga a um compromisso sério, consciente e decidido com a exigência, o trabalho e o método, investindo tudo o que somos e temos num projecto de ensino de qualidade e excelência. Direito escreve-se com dedicação e mérito, esforço e sacrifício; não com promoções, facilidades, sorrisos e palmadas nas costas. Ter aproveitamento, não significa sempre e necessariamente vencer. E mais importante que tudo é aprender. Mais tarde ou mais cedo alguém Vos cobrará essas facilidades. E nessa altura verão o quão enganados foram e como dolorosa pode ser uma mentira em que só nós próprios quisemos acreditar.
Na verdade, creio de modo convicto, hoje mais do que nunca, que o futuro da nossa instituição depende muito mais de cada um de nós, do que cada um está disposto a investir de si, por si e para os outros; não tanto do que há-de vir ou deva exigir-se a terceiros: chegou, a meu modesto ver, o momento de descobrir o que pode cada um de nós fazer pela nossa universidade e não tanto o que deverá a Universidade fazer por nós.
Esta casa só vencerá se for diferente: em qualidade e em exigência.
Nesse contexto, e honrando um compromisso que há muito eu próprio adiava, sugeri e coloquei à prudente e competente apreciação superior do Professor José Carlos Vieira Chambel – prontamente aceite com satisfação e reconhecimento, devo dizê-lo –, a concretização de um projecto que sonhava e desenhava no meu imaginário mais altruísta e no qual, confesso, aposto tudo: acompanhar de próximo os alunos, oferecendo-lhes condições únicas de trabalho, facilitando-lhes o acesso a fontes sólidas, apresentando-os a métodos e técnicas de estudo, dando-lhes a mão enquanto caminham e crescem na sua formação jurídica, ajudando-os a fazer e não a explicar-lhes como deve ser feito (pareceres, trabalhos científicos, relatórios e outros de idêntica natureza): sem avaliações, desculpas, obrigações, deveres ou medos. Só armados com o desejo de aprender e agradados em dar e receber, lapidando deste modo cada aluno como se fora – e acredito que alguns o são – um verdadeiro diamante.
Sei, meus amigos, que muitos de Vós mais não fazem porque não podem e porque Vos não dão condições para crescer: o vaso nem sempre é suficientemente grande para deixar crescer a flor, à qual, tempestades ordenadas por ventos soprados de dentro e de fora da nossa instituição, muitas vezes querem roubar a própria luz.
Esse projecto, como já expressei anteriormente, foi aceite e será posto em prática já este ano lectivo: duas sessões semanais de duas horas; duas turmas com um número necessariamente restrito de alunos. Depois de divulgada a iniciativa junto de todas as turmas, as inscrições poderão ser feitas a partir da próxima terça-feira, por e-mail (pdpc@sapo.pt), sms, ou fax, respeitando-se a ordem de entrada (data e hora) das mesmas, funcionando esse como único critério, objectivo, de selecção dos candidatos.
Aproveito ainda para informar que estarei, durante o corrente ano lectivo, disponível um dia e uma hora por semana para atendimento de todos os meus alunos, esclarecendo as dúvidas de cada um e compensando, desta forma, a ausência forçada daqueles que por qualquer motivo, não queiram ou não possam, sempre, frequentar as minhas aulas.
É um singelo contributo meu, que espero seja seguido por outros, de modo a fazer crescer e colorir um sonho que julgo ser comum: uma Universidade de referência com ensino e alunos de excelência.
Obrigado pela Vossa amizade e um excelente ano lectivo para todos.
Despeço-me com um forte abraço,

Paulo Cavaco

4 Comments:

Blogger sissi said...

Estas palavras só se podem esperar de quem entende o ensino não como uma forma de «brilhar» e de exibir competencias, mas sim como uma forma de contruir um mundo melhor, movido por pessoas capazes e necessariamente mais HUMANAS...Por isso lhe agradeço professor...

30 de outubro de 2006 às 16:31  
Blogger alnair said...

Pertenço ao grupo dos que não fazem mais porque não podem.:) São muitos os dias em que me apetece não ter compromissos profissionais e ter toda a disponibilidade para aprender. Por isso, são sempre de louvar as iniciativas que envolvam projectos em que os alunos não são o objecto do ensino, mas sim os sujeitos da aprendizagem.

Para além de podermos aprender a elaborar pareceres, relatórios, trabalhos científicos, não será possível assistirmos, por exemplo, a uma audiência? de vivenciarmos a prática? de nos explicarem aquilo que parece que é tão banal e óbvio, mas que para nós ainda é tão longínquo e distante?

Obrigada, Professor.

30 de outubro de 2006 às 17:23  
Blogger Ana Rita said...

É importantíssima a dimensão prática de tudo o que temos vindo a aprender. Será sem sombra de dúvida um trabalho que irá enriquecer quem nele puder participar e a Instituição em si.
Bem haja pela iniciativa Professor!

30 de outubro de 2006 às 18:28  
Anonymous Anónimo said...

Tentar e falhar é, pelo menos, aprender. Não chegar a tentar é sofrer a inestimável perda do que poderia ter sido...

16 de novembro de 2006 às 18:11  

Enviar um comentário

<< Home


View My Stats